quinta-feira, 28 de outubro de 2010

APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO E O COMPUTO DO TEMPO DE SERVIÇO RURAL DO MENOR DE 14 ANOS.

APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO E O COMPUTO DO TEMPO DE SERVIÇO RURAL DO MENOR DE 14 ANOS.

A aposentadoria por tempo de contribuição surgiu, com o nomem juris, de aposentadoria ordinária, quando da promulgação, em 23 de agosto de 1960, da Lei Orgânica da Previdência Social.
Referido benefício consistia, há época, em uma prestação pecuniária a ser paga ao Segurado que cumprisse dois requisitos: 55 anos de idade e no mínimo 30 anos de serviço.
Com o passar dos anos o requisito etário foi extinto e a legislação previdenciária passou a adotar apenas o requisito do tempo de serviço, no que a aposentação, dita ordinária, passou a ser conhecida como aposentadoria por tempo de serviço.
Essa sistemática perdurou até o advento da Emenda Constitucional nº 20 de 15 de dezembro de 1998, que inseriu uma série de modificações nos critérios utilizados para concessão desse tipo de benefício, dentre eles a adoção do tempo de contribuição para sua concessão, ao invés do já conhecido tempo de serviço.
No entanto, em que pese a mudança de paradigma, em seu artigo 4º, a EC nº 20, dispôs que o tempo de serviço cumprido até então, seria computado como tempo de contribuição, nos termos definidos na lei.
Em razão disso a legislação infraconstitucional estabeleceu inúmeras situações que autorizariam o computo do tempo de serviço como tempo de contribuição, para fins de concessão da aposentadoria, no entanto, interessa apenas para esse pequeno trabalho, a contagem do tempo de serviço do rurícola menor de 14 anos.
A Lei 8.213/91 no artigo 11, inciso VII, §1º estabeleceu a condição de segurado especial do trabalhador rural individual e em regime de economia familiar, autorizando em razão disso o reconhecimento deste labor como de tempo de contribuição:
Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas: (Redação dada pela Lei nº 8.647, de 1993)
VII – como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de: (Redação dada pela Lei nº 11.718, de 2008)
§ 1o Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes. (Redação dada pela Lei nº 11.718, de 2008)

Do mesmo modo o artigo 55, §2º do mesmo diploma legal possibilita que o tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de sua vigência, seja computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para fins de carência:
Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:
§ 2º O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento.

No que tange a questio juris relativa à possibilidade de se computar o tempo de roça anterior a 1991 não se admite mais discussões nos termos da Súmula 24 da TNU:
SÚMULA Nº 24 O tempo de serviço do segurado trabalhador rural anterior ao advento da Lei nº 8.213/91, sem o recolhimento de contribuições previdenciárias, pode ser considerado para a concessão de benefício previdenciário do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), exceto para efeito de carência, conforme a regra do art. 55, §2º, da Lei nº 8.213/91.
A dúvida surge quanto a possibilidade de se averbar o labor campesino do menor de 14 anos, pois o INSS se opõe a tal assertiva, sob o argumento de que o artigo 11, VII da Lei 8.213/91 deve ser interpretado sob a lógica do artigo 7º, XXXIII da Constituição Federal de 1988 e das Constituições anteriores que expressamente proibiam o trabalho abaixo desta idade.
No entanto, em que pese o argumento comumente expendido pelo órgão previdenciário, tal assertiva contraria a maciça jurisprudência de nossos tribunais que a muito entendem que os menores de idade (14 anos) não podem ser prejudicados em seus direitos trabalhistas e previdenciários, desde que comprovado o efetivo labor.
Ora, a norma constitucional que fixou a idade mínima para desempenho de qualquer atividade laborativa consubstancia-se em uma garantia constitucional em prol do menor, logo não é possível que ela o prejudique se este efetivamente trabalhou.
Neste sentido já se manifestou o STF no histórico julgamento do AgRAI 105.794 conforme trecho do acórdão que abaixo transcrevemos:
“Está claro, ainda, que a regra do inciso X do mesmo dispositivo constitucional – proibindo qualquer trabalho ao menor de doze anos – foi inscrita na lista das garantias dos trabalhadores em proveito, destes , e não em seu detrimento. Não me parece, assim, razoável o entendimento da origem, que invoca justamente uma norma voltada para a melhoria da condição social do trabalhador e faz dela a premissa de uma conclusão que contraria o interesse de se beneficiário, como que a prover nova espécie de ilustração para a secular ironia summum jus, summa injuria. (AgRAI 105.794, 2ª T. Rel. Aldir Passarinho, DJ. 02/05/1986).
E em recente julgamento o i. Ministro Gilmar Mendes reafirmou essa tese:
Agravo de Instrumento. 2. Trabalhador rural ou rurícola menor de quatorze anos. Contagem de tempo de serviço. Art. 11, VII, da Lei nº 8.213. Possibilidade. Precedentes. 3. Alegação de violação aos arts. 5º, XXXVI; e 97, da CF/88. Improcedente. Impossibilidade de declaração de efeitos retroativos para o caso de declaração de nulidade de contratos trabalhistas. Tratamento similar na doutrina do direito comparado: México, Alemanha, França e Itália. Norma de garantia do trabalhador que não se interpreta em seu detrimento. Acórdão do STJ em conformidade com a jurisprudência desta Corte. 4. Precedentes citados: AgRAI 105.794, 2ª T., Rel. Aldir Passarinho, DJ 02.05.86; e RE 104.654, 2ªT., Rel. Francisco Rezek, DJ 25.04.86. 5. Agravo de instrumento a que se nega provimento. (AI 529.694-1, 2ª T., Relator Ministro Gilmar Mendes, Julgamento: 15/02/2005.)
Ora, admitir-se a impossibilidade do reconhecimento acaba por duplamente lesar a criança, que além de ter sido obrigado a trabalhar em tenra idade, sem obter qualquer proteção da família e do estado, não terá tal trabalho computado para fins previdenciários.
Deste modo já decidiu por inúmeras vezes o Superior Tribunal de Justiça:
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. TEMPO DE SERVIÇO. RURÍCOLA. MENOR DE 12 ANOS. LEI Nº 8.213/91, ART. 11, INCISO VII. PRECEDENTES. SÚMULA 07/STJ.
1 - Demonstrado o exercício da atividade rural do menor de doze anos, em regime de economia familiar, o tempo de serviço é de ser reconhecido para fins previdenciários, porquanto as normas que proíbem o trabalho do menor foram editadas para protegê-lo e não para prejudicá-lo. Precedentes.
2 - Recurso especial conhecido.
(STJ, RE 331.568/RS, 6ª Turma, Rel. Min. Fernando Gonçalves, julgado unânime em 23.10.2001, DJ 12.11.2001)

PREVIDENCIÁRIO - RECURSO ESPECIAL - RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL ANTERIOR AOS 14 ANOS DE IDADE - POSSIBILIDADE - NORMA CONSTITUCIONAL DE CARÁTER PROTECIONISTA - IMPOSSIBILIDADE DE RESTRIÇÃO AOS DIREITOS DO TRABALHADOR - DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO COMPROVADA - ART. 255 E PARÁGRAFOS DO RISTJ.
- Desde de que comprovada atividade rural por menor de 12 (doze) anos de idade, impõe-se o seu reconhecimento para fins previdenciários. Precedentes.
- A simples transcrição de ementas não é suficiente para caracterizar o dissídio jurisprudencial apto a ensejar a abertura da via especial, devendo ser mencionadas e expostas as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos confrontados, bem como, juntadas certidões ou cópias integrais dos julgados paradigmas.
- Inteligência do art. 255 e seus parágrafos do RISTJ.
- Precedentes desta Corte.
- Recurso parcialmente conhecido, e nessa parte provido.
(STJ, RE 396.338/RS, 5ª Turma, Rel. Min. Jorge Scartezzini, julgado unânime em 02.04.2002, DJ 22.04.2002)

Logo, não há qualquer óbice ao computo como tempo de serviço do trabalho rural exercido por menor de 14 anos, podendo os Segurados que laboraram nesta condição requerer a averbação do período, a fim de que não sejam duplamente prejudicados.

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Informações para a imprensa:

Cristiano H. P. é advogado do escritório Pereira, Camargo & Lara – Advogados Associados, atuante na área de Direito Previdenciário.
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e-mail: cristiano@pclassociados.com.br/ Tel.: (19)3383-3279

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